Imunizante precisa passar por análise da Conitec antes de ser incorporado ao SUS. Na rede privada, já está disponível por mais de R$ 300 a dose
A Qdenga, nova vacina contra a dengue, começou a ser aplicada este mês no Brasil em clínicas e laboratórios privados. Embora aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) desde março, não será disponibilizada no Sistema Único de Saúde (SUS) nem incorporada ao Calendário Nacional de Vacinação, pelo menos até 2025, segundo o Ministério da Saúde.
De acordo com membros da pasta, o imunizante ainda tem de passar pela análise de eficácia, efetividade, segurança e impacto econômico da nova tecnologia com base nas melhores evidências científicas disponíveis pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec). O laboratório Takeda Pharma, que produz a vacina, pretende enviar o pedido de avaliação ainda este mês, o que deve demorar de 12 a 18 meses. A regulamentação do órgão, porém, diz que o prazo para análise é de 180 dias, contados a partir da data do protocolo de solicitação, prazo que pode se estender por mais 90 dias, dependendo das circunstâncias exigidas.
O Ministério da Saúde também quer dar prioridade à produção nacional da vacina da dengue. Só que a versão nacional (Butantan-DV) está sendo desenvolvida pelo Instituto Butantan, em São Paulo, desde 2009 e não tem prazo de liberação e utilização, já que ainda não teve a pesquisa concluída. Nos ensaios clínicos de fase 3, esse imunizante mostrou uma eficácia de 79,6% para evitar a doença. Em 2024, o acompanhamento completa cinco anos e poderá, então, ser submetido à aprovação da Anvisa. Se aprovada, a vacina poderá ser disponibilizada em 2025.
Ou seja, quem quiser ser imunizado contra a doença, vai ter de desembolsar entre R$ 301,27 e R$ 500 reais por injeção, segundo tabela da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), sendo que o esquema vacinal é composto por duas doses, com intervalo de três meses.
Nos ensaios clínicos, a Qdenga demonstrou eficácia geral de 80,2% contra a dengue causada por qualquer dos quatro sorotipos diferentes do vírus que provoca a doença, transmitida pela picada da fêmea do mosquito Aedes aegypti. Diferentemente da vacina Dengvaxia, do laboratório francês Sanofi, que nunca chegou ao SUS e só pode ser dada a quem teve dengue, a Qdenga pode ser aplicada tanto em quem já teve a doença quanto em quem nunca foi infectado (pessoas de 4 a 60 anos).
A vacina da Takeda também reduziu as hospitalizações em 90%. “Ela não só cumpriu todos os critérios de eficácia, como também de segurança”, afirma Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm). “Também não foram observados efeitos colaterais importantes nesses grupos vacinados durante os estudos, ou seja, confirma o perfil de segurança no curto e no longo prazo, bem como a persistência da proteção por praticamente cinco anos daqueles indivíduos vacinados”, completa o infectologista, sobre o imunizante que em dezembro de 2022 também foi autorizado na Europa pela European Medicines Agency.
“O Brasil precisa com urgência iniciar a vacinação de sua população. É claro que não vamos dispor de doses da noite para o dia para todos os brasileiros, mas precisamos iniciar, definir quem são os grupos prioritários, que regiões vacinar e que idades, de acordo com o número de doses que teremos disponíveis, para que avancemos em um programa de uma doença com impacto tão grande como é a dengue no nosso país. É desejo de todos que, em breve, ela seja incorporada no programa público de vacinação”, explica Kfouri.
Vale ressaltar que a Qdenga, por se tratar de uma vacina de vírus vivos enfraquecidos, é contraindicada para grávidas, mulheres que estão amamentando e pacientes com imunossupressão grave, ou seja, aqueles com câncer, transplantados e portadores do vírus HIV. “Indivíduos que têm alguma comorbidade, como diabéticos e cardíacos, podem e devem tomar a vacina, já que o risco de agravamento da dengue é ainda maior nessa população”, alerta o médico.
Situação preocupante
Em 2022, o Brasil atingiu um número recorde de mortes por dengue: 1.016 registros de óbitos. Nos primeiros meses deste ano, as taxas também foram bem altas no país, com 635 mortes confirmadas até junho, período em que mais de 1,3 milhão de casos foram registrados, segundo o último boletim do Centro de Operações de Emergências de Arboviroses (COE Arboviroses). Um recorde desde a década de 1980.
Pessoas de qualquer faixa etária são passíveis de contrair a dengue, sendo as mais velhas e com doenças crônicas, como as hipertensas e diabéticas, as que possuem maior risco de desenvolvimento de casos graves que podem levar à morte. A forma mais grave é a dengue hemorrágica, mais comum quando se contrai o vírus pela segunda vez.
Entre os principais sintomas estão febre alta, dor no corpo e articulações, mal-estar, dor de cabeça e atrás dos olhos e manchas vermelhas no corpo. A forma mais eficaz de evitar a doença é não deixar acumular água parada, onde o mosquito se reproduz. “Por isso é tão importante a vacinação, que não só evita o adoecimento individual, como ajuda no controle de uma doença que impacta de uma maneira extremamente significativa todo o nosso serviço de saúde”, finaliza o médico.